Com dívidas que somam R$ 1,76 bilhão, o empresário Washington Cinel, dono do grupo que controla a Gocil, uma das maiores empresas de segurança privada do país, pegou R$ 510 milhões em empréstimos com uma agência do Banco do Nordeste (BNB) no Maranhão, dias antes de entrar com pedido de recuperação judicial (RJ) na Justiça de São Paulo, no fim de setembro.

Nas quatro cédulas de crédito bancário emitidas pelo BNB entre os dias 26 de julho e 21 de setembro, obtidas pelo Metrópoles, Cinel dá como garantia a alienação de uma fazenda de 23 mil hectares — o equivalente a mais de 20 mil campos de futebol —, comprada por ele em 2022 e avaliada em R$ 325 milhões. A propriedade fica no município de Balsas, o mesmo da agência que concedeu os empréstimos, no interior do Maranhão.

Oito dias depois dos últimos empréstimos do BNB, no valor de R$ 32 milhões, o Grupo Handz, que pertence a Cinel e controla várias empresas, entre elas a Gocil e a Nova Olinda SPE, proprietária da fazenda no Maranhão, entrou com pedido de recuperação judicial (RJ) na Justiça paulista, alegando incapacidade de quitar dívidas com credores.

A operação feita pelo grupo de Cinel com o BNB chama a atenção por dois motivos principais: primeiro, pelo fato de a análise prévia de crédito feita pelo banco, praxe em todas as instituições, não detectar a grave situação financeira que levou o grupo empresarial a pedir recuperação judicial dias depois dos empréstimos, que reforçaram o caixa em mais de meio bilhão de reais.

Outro ponto é que, da maneira como foi feita, a operação com o Banco do Nordeste blinda a fazenda de Washington Cinel no Maranhão dos outros credores listados na RJ. Isso porque quando uma propriedade é usada como garantia em um empréstimo bancário, há jurisprudência nos tribunais superiores para reconhecê-lo como bem protegido dos efeitos de uma recuperação judicial.

Nesse caso, a própria defesa de Cinel afirmou à 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo que o crédito tomado com uso da fazenda não está sujeito à recuperação. O juiz Paulo Furtado de Oliveira Filho ainda não decidiu se autoriza o início da recuperação judicial. Se for aceita, o grupo de empresas do bilionário paulista fica blindado de execuções de medidas de cobrança, como bloqueios de contas e de bens.

Antes de decidir, é comum que os juízes determinem uma perícia para constatar se a empresa realmente está em atividade e evitar que a Justiça seja induzida a erro e endosse a recuperação de uma companhia falida.

Culpa da fazenda

No laudo pericial apresentado ao juiz, há um capítulo especial para a fazenda no Maranhão. Durante a diligência na sede da Gocil em São Paulo, a CEO Ângela Miyamura, relatou que um dos motivos da crise do grupo foi justamente a expansão da atividade agrícola da fazenda, que é recém-explorada e teve orçamento acima do previsto. Com os juros altos, segundo ela, houve um “desencontro de fluxo de caixa”.

Em visita à fazenda, os peritos afirmaram que há “forte presença de maquinário agrícola” e que “novas estradas estão sendo construídas”. Também estão sendo feitos alojamentos e refeitórios para os 139 funcionários. Segundo relatado aos peritos, haverá colheita de 12 mil hectares de soja e 1,3 mil hectares de arroz na fazenda de Cinel em Balsas, interior do Maranhão.

Ao pedir a recuperação judicial, a defesa de Washington Cinel afirma que, apesar de serem ramos totalmente diferentes, a segurança privada e as fazendas “dependem umas das outras para a continuidade de sua operação”. Ao todo, ele listou à Justiça cinco sociedades de empresas de produção rural que controla.

Do Metrópoles