O presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Luís Roberto Barroso, disse nesta quinta-feira (23) que a erosão das instituições em países que recentemente viveram retrocesso democrático começou por mudanças nas supremas cortes.
“Os antecedentes não são bons”, disse, em resposta à aprovação no Senado no dia anterior da PEC que muda as regras de decisões monocráticas no STF.
Ele afirmou que o tribunal não vê razão para mudanças constitucionais que visem a alterar as regras de seu funcionamento. “O STF é alvo de propostas de mudanças legislativas que, na visão da corte, não são necessárias e não contribuem para a institucionalidade do país.”
Barroso acrescentou que, em um país com demandas importantes e urgentes, que vão do avanço do crime organizado à mudança climática que impacta a vida de milhões de pessoas, nada sugere que os problemas prioritários do Brasil estejam no STF.
“Até porque as mudanças sugeridas já foram acudidas, em sua maior parte, por alterações recentes no próprio regimento do Supremo”, declarou.
O presidente do STF disse que o Senado e seus integrantes “merecem toda a consideração institucional do tribunal”, assim como respeito às deliberações daquela Casa Legislativa.
Porém afirmou que a vida democrática é feita do debate público constante e do diálogo institucional, “em busca de soluções que sejam boas para o país e que possam transcender as circunstâncias particulares de cada momento”.
“Cabe ao Supremo fazer valer Constituição, preservar a democracia e proteger direitos fundamentais. A pergunta a se fazer é a seguinte: esses objetivos foram alcançados? A resposta é afirmativa. Isso significa que o Supremo Tribunal Federal cumpriu o seu papel e serviu bem ao país. Não há por que alterar o que vem funcionando bem”, disse.
Barroso também ressaltou que, nos últimos anos, o STF enfrentou o negacionismo em relação à pandemia, “salvando milhares de vidas, o negacionismo ambiental, enfrentando o desmatamento da Amazônia e a mudança climática, bem como funcionou como um dique de resistência contra o avanço autoritário”.
Também falou que, por essa atuação, o tribunal sofreu ataques verbais e “a criminosa invasão física que vandalizou as instalações da corte”, referindo-se ao 8 de janeiro.
“Após esses ataques verbais e físicos, o tribunal vê com preocupação avanços legislativos sobre sua atuação. Nos últimos 35 anos, o Brasil viveu situações institucionais complexas, que em outros tempos teriam levado à ruptura constitucional e democrática: crises econômicas, inflação descontrolada, escândalos de corrupção e dois impeachments. Apesar de tudo o que ocorreu, o país preservou a estabilidade institucional e a democracia”, disse.
A PEC foi aprovada com 52 votos a 18, de 49 que eram necessários. O texto agora segue para avaliação da Câmara dos Deputados. No Senado, o líder do governo na Casa, Jaques Wagner (PT-BA), votou a favor da proposta.
A PEC define que as chamadas decisões monocráticas não podem suspender a eficácia de uma lei ou norma de repercussão geral aprovada pelo Congresso e sancionada pela Presidência da República —para isso, obriga que haja decisões colegiadas.
Foram ajustados alguns trechos do texto original, com a retirada, por exemplo, de um ponto que limitava o pedido de vistas em julgamentos —uma vez que a ex-ministra Rosa Weber já alterou o regimento do Supremo para restringir este dispositivo, que acabava postergando as decisões da corte.
Outra mudança que atenuou a proposta original foi a exclusão do escopo da PEC das decisões da Presidência da República, como decretos ou nomeações, que estavam previstas inicialmente.
ENTENDA O QUE MUDA COM A PEC QUE LIMITA DECISÕES MONOCRÁTICAS
Como é
Ministros do STF podem deliberar monocraticamente sobre qualquer tema envolvendo os outros Poderes e instâncias administrativas; mudança recente no regimento interno da corte definiu que decisões liminares dos magistrados precisam ser confirmadas pelos outros membros no plenário virtual em até 90 dias
Como ficaria
Se aprovada, a proposta proibirá decisões monocráticas para suspender eficácia de lei aprovada pelo Congresso e sancionada pela Presidência; somente o presidente da corte, atualmente Luís Roberto Barroso, poderia decidir monocraticamente e durante o período de recesso judiciário, com análise do resto do tribunal em até 30 dias após o retorno das atividades
Retirado da PEC
Uma mudança feita foi excluir do escopo da PEC as decisões da Presidência da República, como decretos ou nomeações, que estavam previstas inicialmente